Negócios são negócios

domingo, 26 de junho de 2011
Texto: Camila Teixeira
Edição: Mayra Wenzel


“Você não pode fazer jornalismo esportivo no Brasil e não apontar erros como no Pan do Rio. [Mas] nós não vemos isso na TV aberta, pois eles possuem os direitos disso e daquilo”. Foi com esta frase que Juca Kfouri, apresentador da rádio CBN e âncora do canal fechado ESPN, respondeu pergunta sobre a ética no jornalismo esportivo em palestra feita nas Faculdades Integradas Rio Branco durante a 11ª Semana da Comunicação. Enfática e emblemática, a resposta suscita novamente a questão da importância dos veículos de comunicação para a formação da opinião pública e – por que não? – para a formação da sociedade brasileira. Será que a nossa imprensa esportiva de fato cumpre o seu papel de articuladora de questões sociais e fiscalizadora do poder público?

Ainda que haja aqueles que sustentem que a cobertura esportiva trata da parte light do jornalismo diário, a verdade é que, principalmente no atual cenário, com o Brasil tendo sido sede do último Pan Americano e da próxima Copa do Mundo e Olimpíadas, a importância da midia esportiva é ampliada. Em tempos em que o Tribunal de Contas da União (TCU) divulga com mais frequência do que certamente gostaríamos relatórios que indicam atrasos em obras e orçamentos imensamente maiores do que o inicialmente previsto, cabe a imprensa esportiva do País assumir o papel de fiscalizadora dos gastos públicos.

Contudo, ainda que esta função básica e inerente do jornalismo pareça óbvia, no contexto brasileiro, em que os principais veículos de comunicação pertencem, em sua esmagadora maioria, a grupos restritos, pode-se observar que desta premissa não é feita necessariamente uma regra. Tomando como exemplo o Campeonato Brasileiro, é de conhecimento público que a receita dos maiores clubes futebol nacional hoje é composta, em grande parte, pela verba proveniente dos direitos de transmissão de seus jogos, inclusive este um dos motivos que causou o recente racha no Clube dos 13. Havendo neste episódio a negociação feita diretamente com a entidade, da qual a Rede TV saiu vencedora, e a negociação paralela feita pela Rede Globo, negociando valores individualmente com os princiais times da serie A, já não estariam ambas emissoras em posições no mínimo questionáveis para abordar a questão?

De fato, os principais jornais e programas esportivos dos canais pouco tocam no assunto. Obviamente não o ignoram, afinal, o episódio Diretas Já, em 1993, e a repudiável atitude da emissora dos Marinho na época de distorcer os fatos tais como eles aconteciam, demonstram que diminuir a importância de um fato polêmica não só não funciona como pode ser um tiro no próprio pé. Ainda assim, coberturas superficiais ou que simplesmente fogem das questões centrais e raízes do problema também de pouco ajudam.

Porém, a inércia de certos veículos não se restringe apenas ao futebol, ainda que este seja o carro-chefe das coberturas esportivas de norte a sul do País. Uma das principais justificativas para trazer o Pan Americano de 2007 para o Rio de Janeiro era o desenvolvimento urbano que as obras de infraestrutura trariam à cidade e o legado olímpico que as estruturas dos jogos deixariam à cidade maravolhosa. Quatro anos passados, o parque aquático Maria Lenk recebe apenas competições esporádicas e tampouco abrigará as competições de natação das olimpíadas de 2016, devendo ser contruído novo complexo aquático para os jogos; do mesmo modo, a linha de barca que ligaria a Barra da Tijuca ao centro e a linha de metrô que levaria ao aeroporto também não saíram do papel; não obstante, o estádio do Maracanã recebeu as finais masculina e feminina do futebol, mesmo após a construção do Engenhão.

Novamente, não estariam conflitos de interesse interferindo na apuração e divulgação de informações a sociedade? Afinal, o que é fazer jornalismo esportivo no Brasil? Enganam-se aqueles que acreditam que esporte e entretenimento andam de mãos dadas em coberturas jornalísticas. Todavia, também se enganam aqueles que possam dizer que trata-se de fazer denúncias, ao mais fiel tipo de jornalismo investigativo. Ainda que haja a possibilidade, o que acontece hoje é que os maiores veículos formadores de opinião do País mantêm negócios com as entidades que coordenam o esporte brasileiro nas mais diversas modalidades, o que fatalmente cerceia a liberdade de expressão.

Apesar de vivermos numa democracia há praticamente duas décadas e a liberdade de imprensa estar previsto na Constituição, hoje a mídia brasileira, mas principalmente a esportiva, se cala não mais diante dos generais da ditadura militar, mas às entidades que protegem os seus interesses, afinal de contas, ainda reverenciamos a ultrapassada máxima: negócios são negócios. Mas será que são mesmo?